Se mais não houvesse, bastariam os cinco filmes que fez com John Ford para a imortalizar. E se nunca os viu, é bom que comece rapidamente a comprar os dvd’s… Ora tome nota: “O Vale Era Verde”, Óscar de Melhor Filme de 1941. “Rio Grande” (1950) e “O Homem Tranquilo”, Óscar de Melhor Realizador em 1952, ambos ao lado de John Wayne. “The Long Grey Line” (“Uma Vida Inteira”) em 1955 e, de novo com Wayne, “The Wings of Eagles” (“A Águia Voa ao Sol”) em 1957. São estes os títulos mais marcantes da vida de Maureen O’Hara, que morreu no passado fim de semana, aos 95 anos de idade.
O’Hara já não aparecia no cinema desde “Only the Lonely” (“Eu, Tu e a Mamã”) de Chris Columbus, que fez em 1991. Antes disso, esteve retirada vinte anos e depois desse filme com John Candy só voltou a representar em três tele-filmes. Há exatamente um ano, a sua longa carreira no cinema clássico americano foi celebrada pela Academia de Hollywood com um Óscar Honorário, que lhe foi entregue por dois fãs confessos: Clint Eastwood e Liam Neeson.
O primeiro a reparar no seu talento e na sua beleza foi Alfred Hitchcock, que lhe deu o papel principal em “Jamaica Inn”. Estávamos então em 1939 e a partir daí Maureen O’Hara passou pelas mãos de alguns dos melhores que havia na indústria: Jean Renoir, Budd Boetticher, Henry King ou John M. Stahl por exemplo.
Maureen O’Hara tornou-se na heroína por excelência do cinema de aventuras americano. Trabalhou ao lado dos maiores galãs da época como Errol Flynn ou Douglas Fairbanks Jr., Anthony Quinn ou Jeff Chandler. A lutar com índios, contrabandistas, espiões, com espadachim na mão ou uma pistola no oeste, em navios de piratas ou em paisagens paradisíacas, O’Hara foi a grande guerreira de dezenas de produções.
Em 53 anos de cinema e 95 de vida, Maureen O’Hara foi sempre uma mulher de armas, “a única mulher no mundo que pode dar luta a John Wayne”, dizia-se na altura. “A Rainha do Technicolor”, como ficou conhecida por tantos, passou por aventuras exóticas em “Bagdad” (1949), em “Tripoli” (1950) ou em “Malaga” (1954). E também em “Lisboa”, no ano de 1956, num filme quase esquecido, dirigido por um actor chamado Ray Milland.
“Lisboa” foi uma das primeiras grandes produções internacionais rodadas inteiramente em Portugal. Com Milland, O’Hara e Claude Rains, mas também com a participação dos portugueses Humberto Madeira e Vasco Santana. E foi um dos primeiros filmes internacionais a usar como cenários o Terreiro do Paço, o Castelo de São Jorge, Sintra ou Cascais. Ou a Torre de Belém, logo no genérico inicial…
Até uma jovem e deslumbrante Anita Guerreiro cantou fado para o casal do filme, como se (re)descobre no YouTube.
Maureen O’Hara regressou a Lisboa para a estreia do filme e foi recebida em glória como é devido às grandes estrelas.
No final da década de cinquenta e durante os anos sessenta, continuou a despertar o interesse de novos cineastas que foram surgindo, como Sam Peckinpah (“Companheiros da Morte”, 1961) e teve sempre a seu lado os maiores do seu tempo: Wayne de novo, mas também James Stewart ou Henry Fonda. Depois, partiu para a sua Irlanda natal onde viveu até 2012, voltando esporadicamente a Hollywood. Quer para homenagens como a da Academia Britânica nos anos 90 (onde a entrevistei para a SIC, na foto) quer para a grande cerimónia dos Óscares de Carreira de Novembro do ano passado. Os seus três últimos anos foram vividos em Boise, no estado de Idaho, com o seu único neto e os seus bisnetos. Uma família tranquila, em três casas, todas na mesma rua da cidade.
Miguel Monteiro
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