Quando for grande, quero ser… bombeiro

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A nossa ingénua ambição de criança passou por várias fases. Tínhamos em nós todos os sonhos do mundo, embora nenhum plano para os fazer acontecer. Saltámos do astronauta que vai à lua para o veterinário melhor amigo dos animais, e depois para o arquitecto das casas bidimensionais, e depois para o jogador da bola que vai chegar ao Real Madrid, e depois, e depois… Pelo meio, (quase) todos nós também desejámos ser bombeiros.

Estávamos na idade de ser do contra e a toda a hora ouvíamos da boca dos nossos pais que não se devia brincar com o fogo. Também estávamos na idade de não ter a noção do perigo. E também estávamos na idade em que o altruísmo e a crença de que podemos salvar o mundo são uma espécie de instinto básico. Agora, se pararmos uns segundos para pensar, percebemos que até podíamos ter dado óptimos bombeiros. Afinal de contas, eles são do contra – porque vão em direcção às chamas, quando alguém no seu perfeito juízo foge delas -, eles não têm a noção do perigo – ou, se têm, estão-se nas tintas para ele -, e eles oferecem a própria vida pela dos outros. Então, por que raio é que acabámos sentados à frente de um computador ou atrás de um balcão? Por que raio é que não somos em grandes o que queríamos ser enquanto pequenos? A resposta é simples. Tudo, naquela idade, se resumia a uma busca incessante por heroísmo, a uma tentativa de ser o macaquinho de imitação do mais forte de todos dos desenhos animados. E, afinal, os que hoje em dia são bombeiros são precisamente aqueles que nunca quiseram (nem querem) ser heróis. 

Se recuarmos à Grécia Antiga, vemos que o conceito de herói surge de uma mistura de sangue eterno divino com sangue mortal humano. Na maioria dos casos, o herói carrega toda uma nação às costas. Se, em vez disso, recorremos à pop culture norte-americana, o herói é pintado como o arrogante solitário que tira proveito de super-poderes para saciar o seu desejo de vingança, de auto-superação ou simplesmente porque não tem mais nada de interessante para fazer. Para qualquer uma das situações, o herói é sempre o protagonista da história, a capa do livro, a manchete do jornal, o merecedor da glória e o destino dos aplausos (ou das críticas). Ora, que eu me lembre, nunca algum bombeiro foi narrado nas páginas das epopeias de Virgilio, Homero ou Camões, nem nos quadradinhos da Marvel e da DC. Primeiro, os bombeiros são filhos de dois comuns mortais, logo, são um comum (e raro, ao mesmo tempo) mortal. Não há nada de sobrenatural naqueles genes. Depois, nunca vi nenhum herói com um super-poder tão vulnerável quanto uma… mangueira. Não voam, não se teletransportam, não foram abençoados com o dom da invisibilidade ou da ubiquidade, não têm uma pistola supersónica e, muito menos, têm poder para ressuscitar. Aliás, se há coisa de que eles estão cheios é de calcanhares de Aquiles. Por todas estas (e muitas outras) razões, eles partem em clara desvantagem para enfrentar o vilão que, neste caso, é o fogo.

Posto isto, permitam-me distinguir entre quatro tipos de heróis: os heróis “normais” (um Hércules, por exemplo), os anti-heróis (como é o caso do Batman), os heróis improváveis (quem melhor do que o próprio Éder?) e… os bombeiros, que são heróis sem terem capacidades para o ser, sem terem ambição de o ser, sem saberem que o são e, acima de tudo, sem terem a devida recompensa por o serem. No fundo, são crianças, mas sem a parte de quererem um pedestal. Alguém que faça um filme ou escreva um livro sobre eles. O amor deles pela vida dos outros, esse sim, é fogo que arde sem se ver. Obrigado, bombeiros de Portugal.

E vocês, o que querem ser quando forem ainda mais grandes?

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