Não foi um dia diferente, foi um dia completamente Diferente
Era quinta-feira, seria uma quinta-feira normal não fosse o caso de ter acordado para ir, como de costume, para o liceu e ter observado o meu pai junto a radio tentando ouvir a BBC. Isso intrigou-me e perguntei-lhe o que se passava. Ele prontamente diz: ” – Está a acontecer uma revolução em Lisboa, mas prepara-te que há aulas na mesma”. A primeira aula do dia era Português. A professor era jovem e eu achei por bem informá-la do que se passava e depois de levantar o dedo e pedir para falar digo com alguma excitação: – Professora há guerra em Lisboa! A professora algo surpreendida com a expressão diz: – Não se preocupem que não chega cá. Comecei a pensar e rapidamente cheguei à conclusão que de facto Lisboa ficava muito longe e a preocupação do meu pai era infundada. Ainda não tinha passado meia hora e o movimento de entrada e saída de professores e contínuos com comentários e conversas entre eles deixava-me contudo inquieto com o que se passava, mas rapidamente essa inquietação passou a um estado de euforia quando a professora nos diz que as aulas vão ser interrompidas.
Saímos da sala de aulas e somos confrontados com colegas mais velhos que nos instigavam a deslocarmo-nos ao liceu feminino para pedir às nossas colegas que se juntassem a nós. Pareceu-me uma boa ideia, um dia sem aulas e na companhia de raparigas. Quando chegámos ao liceu feminino as nossas colegas estavam impedidas se sair e coladas aos vidros das janelas.
Assim começou a primeira manifestação livre em Braga. Com algum custo, a reitora lá deixou sair as raparigas e fomos juntos para a praça do comércio onde se situava a câmara municipal. Lá chegados encontramos a praça cheia de gente que gritava: – Liberdade, Liberdade.
Sem entender o significado comecei também a gritar acompanhado pelos meus colegas. Aos poucos lá fomos entendendo o que se passava. Palavras de ordem como “fim à guerra colonial”, “libertação dos presos políticos” ou “morte aos pides” fizeram eco na minha cabeça e mais tarde, à hora de jantar, pus essas questões ao meu pai que prontamente me disse “não se fala de política à mesa”. Eram ainda resquícios de um passado muito próximo, mas esse dia mudou radicalmente a minha vida, vivi esse período com muito entusiasmo e com una vontade férrea de perceber o mundo que me rodeava. Por isso e com esta distância posso dizer que foi o período mais feliz da minha vida.
Viva o 25 de Abril
Almeno Gonçalves