Bons Amigos | Martim Torres

Martim Torres

photo Adriana Boiça Silva

Ouvir discos pela primeira vez.

Quando ouvimos um disco pela primeira vez, nunca mais o vamos poder ouvir pela primeira vez. Aconteça o que acontecer, depois disso já sabemos ao que vamos. Não podemos mais ser surpreendidos. Tive esta epifania quando no outro dia o meu amigo Samuel Úria me ofereceu o primeiro disco d’Os Pontos Negros. Para mim que sou fanático da banda e ainda não tinha descoberto tão antigo registo, ouvi-lo foi como ir ao cinema ver a prequela de um dos meus filmes preferidos. Algo que nos traz elementos que dão muito mais informaçōes sobre os personagens e a trama.

Não faz então sentido que uma experiência com tanto poder mereça uma escuta como deve ser? 

Atenção, eu estou aqui a falar de duas coisas: de ouvir discos pela primeira vez, mas sobretudo da forma como o fazemos.

Hoje em dia, o pessoal está sempre cheio de pressa. A maneira como se conhecem as novas músicas é no youtube, nas colunas do computador ou, pior ainda, no telemóvel! Pomos as músicas a tocar durante um minuto e depois fechamos sem nos lembrarmos que nunca mais vamos poder ouvir pela primeira vez aquela música.

Quando lemos um livro, não gostamos de saltar páginas e perder partes da história. Pois quando ouvimos uma música em más condições, o efeito é o mesmo. Perdemos bocados da história. Chegamos secalhar ao fim. Mas sem perceber bem o que aconteceu.

Façam um favor a vocês próprios e dêem um salto a uma worten qualquer da vida. Gastem uns trocos numa aparelhagem boa. Montem a dita em frente ao sofá com o cuidado de colocar as colunas na posição geométrica para que o vosso lugar no sofá seja o “sweet spot” acústico. Eu gosto de criar o triângulo estereofónico perfeito onde um extremo somos nós, e os outros dois as colunas.

Não é fácil explicar a sensação que é ouvir música desta forma. Pô-la a tocar e simplesmente não fazer mais nada a não ser escutar, sem a distração do vídeo ou do feed do facebook. Com a alta definição de uma boa aparelhagem. Qual é o interesse de investir tanto em produção se depois não ouvimos as coisas em termos? Imagem ir ao cinema ver o mad max, e em vez da tela 3D estar no palco uma televisão pequena e quadrada dos anos 80 que só funciona a preto e branco e com má recepção.

Entender todo o trabalho que os artistas tiveram na gravação, mistura e masterização. Acreditem, é uma experiência essencial. Não passem ao lado disto. Oiçam a música como ela deve ser ouvida.

Abraços a todos

Martim